domingo, 3 de janeiro de 2016




   Assistência Espiritual dentro da Umbanda

Por Fernando Sepe


Amor e caridade, eis a filosofia básica dentro da Umbanda. Independente da linha ou
escola doutrinária seguida, essas duas palavras sintetizam todo e qualquer sério templo
dentro da nossa religião. 

A Umbanda tem como objetivo servir de ligação ao Criador Olorum,despertando as pessoas para o verdadeiro amor, o incondicional, e tem na caridade sua forma mais objetiva de colocar tudo em prática.

Se por um lado a Umbanda virou sinônimo de caridade ou assistência espiritual, por outro lado muito pouco desenvolveu – se em relação a outros aspectos. 

Esqueceu – se que as atividades de assistência, ou caridade ao próximo, podem ser de dois tipos básicos: a consolação e o esclarecimento*.

A “consolação” é o que vemos todos os dias dentro do terreiro. 

As pessoas vêm e individualmente recebem conselhos a respeito do seu dia – dia, recebem passes com o objetivo de limpeza energética, energização, cura e muitas outras funções. Muitos encontram
no “colo” do preto – velho, ou na alegria do baiano, o amigo que lhes falta dentro do seio da
sociedade, o pai sábio e amoroso a lhes orientar.

A consolação não tem como grande objetivo ensinar, mas sim auxiliar de forma direta.
Ela “dá o peixe”. 

Atinge as necessidades da maioria da população. É mais emocional do que racional, e trabalha individualmente dentro de cada um. O trabalho caritativo de consolação é extremamente importante, principalmente devido às carências emocionais e conscienciais que ainda afligem a sociedade.

Essa busca incessante pela caridade é ainda, notavelmente, uma influência grande da consciência cristã que muito influenciou e ainda influencia dentro do pensamento umbandista. Podemos encontrar esse tipo de pensamento também em outras escolas cristãs espalhadas pelo mundo, como na Igreja Católica, no Protestantismo e dentro do Espiritismo/kardecista.

Assim, a “caridade de consolação” já encontra – se totalmente fundamentada dentro do segmento umbandista. Mas ela traz com ela uma grande lacuna: o esclarecimento das
milhares de pessoas que frequentam a assistência dos templos.

O esclarecimento não “dá o peixe” mas ensina todos “a pescarem”. 

O esclarecimento ensina, e dessa forma, coloca a responsabilidade, ou o destino pessoal, nas mãos de cada um.

O esclarecimento é uma atividade mais racional do que emocional. Atinge as necessidades
coletivas de toda a sociedade.

Visa o autoconhecimento e a independência do espírito encarnado. Visa o reconhecimento de sua divindade pessoal e de suas próprias capacidades. Tem na mediunidade apenas um meio, nunca um fim. Visa também o despertar das capacidades anímicas de cada um. Dá as pessoas uma consciência universal em relação à humanidade, além de cortar e desestimular qualquer processo de fanatismo, idolatria ou “gurujismo”.

É importante que fique claro que não estamos falando de uma pregação moralista, de
uma doutrina dogmática ou de “evangelização”.

Estamos falando a respeito de tornarmos as pessoas livres, fazer com que elas lembrem – se que são grandes pássaros e o destino de cada um é voar por onde suas consciências os levarem.

Como diz um dos guias espirituais que trabalham comigo: “Caridade de consolação” ergue a pessoa, mas depois que ela já está de pé, está na hora de ensiná-la a andar, com a “caridade de esclarecimento”. Pesemos nisso!

Estudando a vida dos grandes avatares da humanidade, veremos que todos, muitos além
de praticarem curas milagrosas, ou grandes fenômenos, deixaram uma vasta sabedoria
buscando o esclarecimento do mundo. 

Vejam a doutrina de auto – realização deixada por Buda, à doutrina do agir consciente de Krishna, a doutrina de amor de Jesus.

Vejam também o quanto muitas vezes o consolo é mal interpretado pelo próximo,
virando algumas vezes uma “obrigação” em relação ao outro que lhes estendem a mão, ou o
que é pior, torna – se um vício ou “muleta emocional – psicológica”, sem a qual as pessoas
não podem viver, discernir ou decidir nada.

Além disso, a busca única pelas necessidades individuais, e, por conseguinte o
“consolo”, é o que levam muitos umbandistas ainda terem em suas mentes a idéia de não
existir necessidade de estudo ou busca de conhecimento por parte deles mesmos. 

Dependem unicamente do guia espiritual, e criam com ele uma relação direta de dependência,
desperdiçando as oportunidades dessa convivência que suas faculdades mediúnicas lhes
facultam.

Não estamos falando que um tipo de assistência é melhor do que outra, mas estamos
falando sim de que as duas devem andar juntas, de mãos dadas, para o melhor
desenvolvimento de todos. 

Estamos falando de esclarecer e consolar. Estamos falando em unir o coração e a mente, para o melhor aproveitamento da atual encarnação.

Estamos propondo a consulta com o guia espiritual, mas também a palestra instrutiva, que pode ser feita inclusive pelos próprios guias espirituais. O intercâmbio entre mundos deveria ser melhor aproveitado, não visando apenas consolar o próximo, mas sim esclarecer a todos.

Estamos propondo aliar aquilo que sempre deu certo na Umbanda com algo que pode ainda mais melhorá-la. 

Estamos propondo o estudo e o esclarecimento de todos os umbandistas, para que todos assumam perante si mesmos, os vossos destinos e por si só busquem o caminho da elevação.

Acreditamos piamente na busca pelo esclarecimento e é desse ideal que surgem veículos como esse Jornal de Umbanda Sagrada por exemplo, que vós agora lê. 

O JUS tem com intuito único levar conhecimento e esclarecimento a todos, preenchendo essa lacuna ainda existente na religião. E assim também surgem os livros inspirados pelo astral superior, os cursos que ensinam e libertam, os programas nos meios de comunicação, os bons e instrutivos sites na Internet.  Tudo isso com a intenção de esclarecer.

Pesem bem: Doações materiais, passes, evangelizações, consultas com os guias são muito importantes e sem dúvida é um ato de caridade. 

Agora, palestras, grupos de estudo, cursos de qualidades, boas leituras, textos de qualidade, entre outras coisas, também são de extrema importância e também são atos caritativos.

Nesse começo de ano, pensem bem qual será a tônica do trabalho espiritual que vocês
todos realizarão. 

Conversem com os vossos mentores. Abram – se para novos ideais. Elevem a mente ao alto, para que as ideias cósmicas superiores desçam sobre vocês.

Umbanda é Amor e Caridade! 

Amor aos Orixás, aos guias, a humanidade toda. Amor espiritual, aquele que nada cobra em troca, aquele que não sente ciúmes nem raiva. Aquele que não tem barreiras e é universal. Aquele que eleva a alma e faz o coração brilhar.

Caridade, ato de amor ao próximo. Ato esse que ajuda e explica, que ergue a pessoa e ensina a caminhar, que auxilia sem criar dependência, que não vende milagres mas sim mostra a responsabilidade de cada um! Caridade, ato que consola e esclarece!

Meditem nisso...

Um Grande Abraço – Fernando Sepe

Obs*: Os termos consolação e esclarecimento com o significado aqui empregado foram
primeiramente fruto de uma reflexão do professor Waldo Vieira, e pode ser encontrado em
seu livro Projeciologia – Panorama das Experiências da Consciência Fora do Corpo Humano –
Capítulo V. Aqui utiliza – se apenas o conceito desenvolvido por Waldo Vieira, aplicando - o de
forma original e pioneira ao universo umbandista.
                                               

                                       O primeiro Preto Velho

por Edmundo Pellizari (RAS ADEAGBO)


Uma antiga lenda contada por velhos juremeiros do Nordeste diz que o primeiro mestre negro
que chegou no Brasil se chamava Joaquim. 

Este era seu nome de batismo cristão. Seu nome africano,provavelmente em língua kimbundu, se perdeu.

Mestre Joaquim era sábio de nascença. 

Na Mãe África, em terras de Angola, desde cedo ele observava os kimbandas ou curandeiros locais. 

Joaquim aprendia tudo o que via. Levado por um tio materno, um grande kimbanda, ele recebeu cedinho a sua iniciação no culto.

Joaquim foi ensinado a observar a Natureza e a descobrir o mistério atrás de cada folha, raiz e
árvore. Mãe Ntoto, o grande Nkizi (espírito natural e transcendente) da Terra, acolheu o jovenzinho
e transmitiu sua bênção regeneradora a ele.

Crescido, o rapaz não teve tempo de formar família. Guerras tribais o levaram longe da aldeia,
onde foi aprisionado e embarcado para a distante nação brasileira. Desembarcando em porto nordestino,foi vendido. 

Trabalhou na lavoura dia após dia. Quieto, mas não passivo, observou o sofrimento de seu povo. Nas poucas horas de tranquilidade atendia aos doentes. Com o auxílio dos espíritos de Mãe Ntoto, descobriu as funções das ervas que aqui cresciam. Preparava breves, poções e mezinhas.

Quando tinha chance, amoitava-se e penetrava no mato, onde falava com os espíritos locais,
invocava os ancestrais e rezava aos Minkizi (o conjunto dos Nkizi).

Certo dia foi procurado por um índio velho, que administrava uma pequena propriedade de um
capataz branco. 

O índio tinha observado as atividades de Joaquim no mato e ficou muito curioso...

Uma amizade forte e espiritual nasceu deste encontro. Foi com este índio que Joaquim conheceu os
poderes da Jurema.

Numa noite ele bebeu da cuia de Jurema do velho tuxaua, sentiu seu corpo frio como a morte,
percebeu a mente crescer e ganhar asas... A alma de Joaquim voou pelos céus e viu as casas ficarem
pequeninas, a Lua ficar mais perto e as estrelas parecerem mais brilhantes. 

Lá no firmamento parecia existir uma luz desconhecida e ele seguiu até lá. O luzeiro foi ficando mais perto e Joaquim encontrou uma aldeia, com gente, casa e tudo. Um cacique desconhecido chegou perto dele e o recebeu com alegria e dignidade. Joaquim entrara misteriosa na Cidade dos Mestres, na Aldeia do Juremal! 

O que ele realmente viu e aprendeu lá nunca contou a ninguém. Mas quando voltou à terra
dos encarnados, ele não era mais um Joaquim, era o Mestre Joaquim!

O tempo corria e nosso mestre, ainda escravo, foi consumindo seu corpo no serviço desumano
imposto a sua raça. 

Um tarde ele se aconchegou depois do trabalho, fechou os olhos e morreu. 

Sua alma foi levada novamente para a Cidade Santa e entrou triunfalmente no santuário da Mãe Jurema, louvado pelos mestres e mestras, profetas e guerreiros.

Certa madrugada uns caboclos montaram uma mesa (sessão espiritual de jurema), cantaram e
abriram as portas reais. Os mestres do Outro Mundo foram baixando um após o outro. Tudo era
harmonia e beleza! Um caboclo maduro e mais escuro cantou:

“Mestre Joaquim, é kimbanda!
Veio trabalhar, é kimbanda!
Mestre Joaquim é de Angola,
é kimbanda! É kimbanda!”*

(Nos Pontos ou Linhos mais modernos e populares, a palavra “é kimbanda”, ou seja “é curandeiro”,
transformou-se em “esquimbanda”. Daí perdemos o sentido tradicional africano.)

Esta foi a primeira vez que Mestre Joaquim acostou (baixou ou incorporou na linguagem dos
juremeiros) e desde então começou seu eterno exercício de caridade, fruto do amor maior e da
ciência sublime. 

Mestre Joaquim de Angola, de cachimbo na mão e chapéu na cabeça: o Rei negro da
Jurema Sagrada! 

O tempo passou depressa... A Umbanda ainda não tinha nascido, mas Mestre Joaquim já procurava outros agrupamentos para levar a sua missão. O negro bantu nunca temeu seus ancestrais e sempre colocou suas almas benditas no coração quente que batia de saudades. Lá nas praias do Nordeste, nas montanhas de Minas Gerais ou no sopé dos morros cariocas, nosso mestre juremeiro africano batia sua bengala e dava seu nome: Pai Joaquim de Angola! Imagem da bondade, da sabedoria e da humildade.

Quando a Umbanda veio a este mundo, gestada na luz de Cristo, no Axé dos Orixás e Minkizis e
abençoada pela energia dos pajés, Pai Joaquim foi um dos primeiros guias a se apresentar.

Afinal já era preto velho diplomado! 

Pai Joaquim baixou e nunca parou de trabalhar.

“Pai Joaquim, ê, ê,
Pai Joaquim, ê á,
Pai Joaquim veio de Angola,
Pai Joaquim é de Angola, Angola á!”

*Usamos neste artigo a palavra Kimbanda em seu sentido tradicional: curandeiro ou xamã
bantu. 

Não é, portanto, uma referência ao quimbandeiro ou praticante da Quimbanda, culto
sincrético com poucos elementos bantu.

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