Preto-velho na Cultura Brasileira e na
Umbanda
Por Alexandre Cumino
Pai Antonio foi o primeiro preto-velho a se manifestar na Religião
de Umbanda em seu médium Zélio Fernandino de Morais onde se estabeleceu a
Tenda Nossa Senhora da Piedade. Assim, ele abriu esta “linha” para nossa
religião, introduzindo o uso do cachimbo, guias e o culto aos Orixás.
O “Preto-velho” está ligado à cultura religiosa Afro Brasileira
em geral e à Umbanda de forma específica, pois dentro da Religião Umbandista
este termo identifica um dos elementos formadores de sua liturgia, representa
uma “linha de trabalho”, uma “falange de espíritos”, todo um grupo de mentores
espirituais que se apresentam como negros anciões, ex-escravos,
conhecedores dos Orixás Africanos.
São trabalhadores da espiritualidade, com características
próprias e coletivas, que valorizam o grupo em detrimento do ego pessoal, ou
seja, são simplesmente pretos e pretas velhas com Pai João e Vó Maria, por
exemplo.
Milhares de Pais João e de Avós Maria, o que mostra um trabalho
despersonalizado do elemento individual valorizando o elemento coletivo
identificado pelo termo genérico “preto-velho”. Muitos até dizem “nem tão preto
e nem tão velho” ainda assim “preto velho fulano de tal”. A falta de
informação é a mãe do preconceito, e, no caso do “preto-velho”, muitos que
são leigos da cultura religiosa Umbandista ou de origem africana desconhecem
valor do “preto-velho” dentro das mesmas.
Preto é Cor e Negro é Raça, logo o termo “preto-velho” torna-se
característico e com sentido apenas dentro de um contexto, já que fora de
tal contexto o termo de uso amplo e irrestrito seria “Negro Velho”, “Negro
Ancião” ou ainda “Negro de idade avançada” para identificar o homem da
raça negra que encontra-se já na “terceira idade” (a melhor idade). Por
conta disso alguns sentem-se desconfortáveis em utilizar um termo que à
primeira vista pode parecer desrespeitoso ao citar um amável senhor negro, já
com suas madeixas brancas, cachimbo e sorriso fácil, por trás do olhar de homem
sofrido, que na humildade da subjugação forçada e escrava encontrou a
liberdade do espírito sobre a alma, através da sabedoria vinda da Mãe África,
na figura de nossos Orixás, vindo de encontro à imagem e resignação de nosso
senhor Jesus Cristo.
Alguns preferem chamá-los apenas de “Pais Velhos” o que é bonito
ao ressaltar a paternidade, mas ao mesmo tempo oculta a raça que no caso é
motivo de orgulho. São eles que souberam passar por uma vida de escravidão com
honra e nobreza de caráter, mais um motivo de orgulho em se auto-afirmar “nêgo
véio” e ex-escravo; talvez assim se mantenham para que nunca nos esqueçamos
que em qualquer situação temos ainda oportunidade de evoluir. Quanto mais
adversa maior a oportunidade de dar o testemunho de nossa fé.
O “preto-velho” é um ícone da Umbanda, resumindo em si boa
parte da filosofia umbandista. Assim, os espíritos desencarnados de
ex-escravos se identificam e muitos outros que não foram escravos, nesta
condição, assim se apresentam também em homenagem a eles, por tê-los como
Mestres no astral.
No imaginário popular, por falta de informação ou por má fé de
alguns formadores de opinião, a imagem do “preto-velho” pode estar associada
por alguns a uma visão preconceituosa, há ainda os que se assustam “com estas
coisas” pois não sabem que a Umbanda é uma religião e como tal tem a única
proposta de nos religar a Deus, manifestando o espírito para a caridade e
desenvolvendo o sentimento de amor ao próximo. Não existe uma Umbanda “boa”
e uma Umbanda “ruim”, existe sim única e exclusivamente uma única Umbanda que
faz o bem, caso contrário não é Umbanda e assim é com os “Preto-velhos”, todos
fazem o bem sem olhar a quem, caso contrário não é de fato um “preto-velho”,
pode ser alguém disfarçado de “velho-negro”, o “preto velho” trabalha única e
exclusivamente para a caridade espiritual.
São espíritos que se apresentam desta forma e que sabem que em
essência não temos raça nem cor, a cada encarnação, temos uma experiência
diferente. Os pretos velhos trazem consigo o “mistério ancião”, pois não basta
ter a forma de um velho, antes, precisam ser espíritos amadurecidos e
reconhecidos como irmãos mais velhos na senda evolutiva.
Quanto menos valor se dá a forma, mais valor se dá à mensagem, e
“preto-velho” fala devagar, bem baixinho; quando assim se pronuncia, todos se
aquietam para ouví-lo, parece-nos ouvir na língua Yorubá a palavra “Atotô”,
saudação a Obaluayê que quer dizer exatamente isso: “silêncio”.
Nas culturas antigas o “velho” era sempre respeitado e ouvido
como fonte viva do conhecimento ancestral. Hoje ainda vemos este costume nas
culturas indígenas e ciganas. Algumas tradições religiosas mantêm esta postura
frente o sacerdote mais velho, trata-se de uma herança cultural religiosa tão
antiga quanto nossa memória ou nossa história pode ir buscar, tão antigos
também são alguns dos pretos velhos que se manifestam na
Umbanda.
Muitos já estão fora do ciclo reencarnacionista, estão libertos
do karma, já desvendaram o manto da ilusão da carne que nos cobre com paixões
e apegos que inexoravelmente ficarão para trás no caminho evolutivo.
Por tudo isso e muito mais, no dia 13 de Maio, dia da libertação
dos escravos eu os saúdo: “Salve os Pretos Velhos! Salve as Pretas Velhas!
Adorei as Almas! Salve nosso Amado Pai Obaluayê, Atotô meu Pai! Salve nossa
Amada Mãe Nanã Buroquê, Saluba Nana!”
Usamos para eles velas brancas ou bicolores, metade preta e metade
branca, tomam café e fumam cachimbo.
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