quinta-feira, 17 de setembro de 2015


                                            Irmão x / Chico Xavier

 

A história parece brejeira, mas o fato é autêntico.

Rafael Provenzano escutava os grandes comentaristas do Evange­lho, entre despeitado e infeliz. 

Ator­mentado de inveja. Queria também falar às massas, comover a multidão. 

Nada lhe fulgia tanto aos olhos como a tribuna. 

E aguardava, ansioso, o dia em que pudesse alcançar aquele ponto saliente no espaço, de onde a sua voz conse­guisse impressionar cen­tenas de ou­vidos. 

Embora fixado à semelhante am­bição, era empre­gado de singela sapa­ta­ria. 

E a sua especialidade era bater pinos em sola.

Vastas vezes, surpreendia-se no trabalho, mentalizando público enor­me e ele a falar, a falar sob aplausos quentes. 

Talvez por isso fosse ranzinza. 

Conflito permanente entre a voca­ção e a profissão. 

A família e os com­panheiros pagavam a diferença. 

A esposa e as quatro filhinhas, em ca­sa, sofriam-lhe a teimosia e o deses­pero. 

Irritadiço, classificava-se à con­ta de tirano do­méstico. 

Apurava com esmero o hábito de chacoalhar e ferir. 

A tensão não se limitava ao círculo mais íntimo. 

A parentela toda aguentava espanca­mentos morais. 

Entre amigos era temido na condição de crítico impertinente. 

Apesar de tudo isso, a paixão de Rafael era pre­gar solenemente a verdade cristã nos templos espíritas.

Certa noite, quando falava Mar­tinho, o orientador espiritual da reu­nião mediúnica de que era partici­pante, Rafael consultou o comuni­can­te a respeito de seus velhos pro­pósitos.

- Sim, meu filho – comentou o ben­feitor, através do médium -, você poderá ensinar, mais tarde, das tri­bunas. 

Agora, porém, é cedo. Con­vém estu­dar, preparar-se, aprender a servir...

E prosseguiu explicando que ban­­ca de solador era também lugar santo. Podia demonstrar fé e abne­gação pelo exemplo, edificar, inspi­rar, auxiliar...

Provenzano ouviu paciente, mas saiu desapontado.

Decorridas algumas semanas, o grupo se aprestava à reunião, em sala adequada. 

Conversa amena. 

Uma hora faltan­do para o início das ora­ções. 

Rafael chega, ale­gre. 

Participa que deseja expor ao estimado Mar­tinho o estudo de um belo sonho e contou aos cir­cuns­tantes que, na noite anterior, se vira espiri­tualmente, fora do corpo físico. 

Sentira-se volitan­do, leve qual pluma ao vento. E contemplara nos céus um cartaz com seis letras “A.D.P.S.B.P.” em projeção radiante. 

Toma­ra nota de tudo ao des­per­tar.

Dona Emília, que supunha nos sonhos um constante veículo para gran­des ensinamentos, inquiriu dele, quanto à conclusão a que chegara.

- Pois a senhora não com­pre­ende?

E Rafael explanou para o audi­tó­rio interessado:

- Segundo a minha intuição, as letras querem dizer: “Agora Deves Pre­gar Sem Bater Pinos”.

E acentuou que, apesar de algum sacrifício para a família, se dispunha a ten­tar outro emprego. 

Precisava de al­gum tempo livre. 

Se isso redun­dasse em privações e provações, afir­mava-se pronto para o que des­se e viesse. 

Por fim, declarou-se can­sado de bater couro de boi para calçados. Aspirava à posição dife­rente.

No horário justo, a pequena assembleia se entregou às tarefas que, naquela noite, se vinculavam a desobsessão.

Atividades preparatórias. Pre­ces. 

E começou movimentado so­corro às entidades enfermas. 

Mar­tinho ocupava o médium esclare­cedor, que, de quando em quando, orientava os serviços, dava ideias.

Rafael pediu vez para con­ver­sar. 

O instrutor, contudo, reco­men­dou-lhe esperasse. 

Necessário de­sin­­cumbir-se de obrigações mais urgentes. 

Entender-se-iam no fim.

Com efeito, ao término das ati­vi­dades, Martinho convidou-o à pa­lavra. 

Algo tímido, Provenzano narrou o sonho, referiu-se às letras lumi­nosas que descobrira no firma­men­to, como que brilhando especial­men­te para ele, e reasseverou os antigos desejos. 

Queria ser grande confe­ren­cista e prometia consagrar-se de corpo e alma, aos ensina­mentos pú­blicos do Evangelho.

O amigo espiritual, sereno, per­gun­tou sobre a interpretação que ele, o interessado, dera a letras.

Rafael repetiu, impávido: “Agora Deves Pregar Sem Bater Pinos”.

O benfeitor espiritual, todavia, pin­tou expressão de complacência no rosto do médium e observou:

- Efetivamente, Rafael, você es­te­ve fora do corpo de carne e viu, de fato a mensagem do plano espiri­tual... 

Mas, engana-se quanto ao que julga ter lido. As letras querem dizer simplesmente: “Antes De Pre­gar Seja Bom Primeiro”. 

Extraído do Livro “Cartas e Crônicas”  / Francisco Cândido Xavier pelo  / Espírito Irmão X / Editora FEB

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