sexta-feira, 13 de novembro de 2015


                                            Kimbanda e Quimbanda

Por Edmundo Pellizari (Ras Adeagbo) 

Kimbanda significa algo como "curandeiro" em kimbundu, um idioma bantu falado em Angola. 

O kimbanda é uma espécie de xamã africano. 

O ofício do kimbanda é chamado de "umbanda"... Todos já ouvimos essa palavra por aqui. 

Quimbanda é um culto afro-brasileiro com forte influência bantu e muito influenciado pela magia negra europeia. 

Kimbanda e Quimbanda se confundem, mas são cultos distintos e com objetivos diferentes. 

O kimbandeiro é um membro ativo de sua comunidade, um doutor dos pobres e intérprete dos espíritos da Natureza. 

Ético, ele sempre trabalha para o bem, a paz e a harmonia. 

O quimbandeiro é um feiticeiro. 

Normalmente vive afastado, não se envolve socialmente. 

Na África, o kimbandeiro faz a ponte entre os Makungu (ancestrais divinizados), os Minkizes (espíritos sagrados da Natureza) e os seres humanos. 

Ele entra em transe profundo, incorpora os seres invisíveis que consultam os necessitados e os aconselham na resolução dos problemas. 

Os espíritos no corpo do kimbanda falam, fumam e bebem. 

Como autêntico xamã, ele sabe que a mata é um ser vivo que respira, come e sente. 

Ela é densamente habitada por diversos tipos de entidades, que transmitem seu conhecimento aos sacerdotes eleitos. 

Alguns destes seres se parecem a "duendes". 

Eles têm uma perna só, um olho só ou falta algum braço. 

Moram dentro da mata e podem cruzar o caminho de algum caçador. 

Um Ponto Cantado para os exus na Umbanda, diz: 

"Eu fui no mato, oh ganga! Cortar cipó, oh ganga! Eu vi um bicho, oh ganga! De um olho só, oh ganga!" 

Ganga vem de Nganga, um dos nomes pelo qual o kimbanda é conhecido. 

Nosso querido Saci Pererê é um deles. 

Ele usa o filá (gorro) vermelho dos kimbandas, o cachimbo dos pretos velhos e o tabaco dos caboclos! 

O quimbandeiro centra seu trabalho na figura de Exu, que é um Orixá yoruba e não um Nkizi bantu. 

A entidade que se assemelha a Exu entre os bantu é chamada de Aluvaiá, Nkuvu-Unana, Jini, Chiruwi, Mangabagabana e Kitunusi dependendo do dialeto e da região. 

Aluvaiá pode ser "homem" ou "mulher" e sua energia permeia tudo e todas as coisas. 

Ele se adapta muito bem à noção umbandista de exu (entidade masculina) e pomba-gira (entidade feminina). 

O quimbandeiro também invoca e incorpora as entidades associadas ao culto do magnífico Orixá Exu, os exus e pombas-giras. 

 Pode haver sincretismo com nomes como Lúcifer, Asmodeus, Behemoth, Belzebu e Astaroth da Cultura Europeia. 

A visão das entidades também pode mudar... 

O kimbandeiro invoca as almas dos antigos Tatas (pais espirituais ou sacerdotes curandeiros) e Yayas (mães espirituais ou sacerdotisas curandeiras). 

Estas almas transcenderam o limite da materialidade e da ignorância. 

Elas possuem bondade, conhecimento e luminosidade. 

Algumas não precisam mais encarnar, pois já evoluíram o suficiente neste mundo. 

O quimbandeiro invoca almas de entidades que em vida foram feiticeiros, malandros, mercadores, homens ou mulheres comuns, etc... 

Na África o sangue é um elemento sacrificial. 

O kimbandeiro oferece um animal a uma entidade, prepara a carne e entrega a primeira porção ao espírito. 

O resto do animal, que se tornou agora alimento, é compartilhado com a comunidade se isto acontece em data festiva. 

O quimbandeiro não está interessado em "sacrificar" (tornar sagrado), ele está preocupado com os poderes mágicos do sangue, vísceras e couro do animal. 

Portanto, teologicamente falando, ele não sacrifica. 

As imagens utilizadas no culto do kimbandeiro são feitas de pedra, madeira e barro. 

Os artesãos procuram modelar as entidades da Natureza de forma natural e simples. 

A imagem é consagrada cerimonialmente, e uma porção do espírito da entidade passa a habitar a efígie. 

Na Quimbanda, na maioria das vezes, são utilizadas imagens de gesso que representam os espíritos aliados. 

Comumente estas imagens têm aspecto avermelhado, podendo ter chifres ou não. 

O kimbandeiro é um agente social. 

Ele depende da comunidade e a comunidade depende dele. 

Quando aceita um pagamento para seu trabalho, ele retira do mesmo a sua sustentabilidade. 

Todo mundo sabe e pactua com isso. 

Não existe abuso. 

Trocas de mercadorias e favores podem substituir o dinheiro como pagamento. 

As pessoas empobrecidas são atendidas sem nada precisar dar em troca. 

As vestes do xamã bantu são normais e naturais. 

Quando está trabalhando usa filá, guias de sementes, cinturão com amuletos e roupas sóbrias. 

Três são os pilares do kimbandeiro: amor, honra e caridade. 

O universo da Kimbanda é composto por três mundos que se interpenetram: 

O mundo celeste onde moram os espíritos celestiais e originais (alguns Minkizis e ancestrais divinizados), o mundo natural habitado pelos homens e pelos espíritos da natureza (elementais) e o mundo subterrâneo da morte e dos ancestrais. 

O médium na Kimbanda é um canal entre os espíritos e os que precisam dos espíritos. 

Ele é um instrumento mágico, um servidor da humanidade que pratica um transe profundo, pois, somente adormecendo o ego o divino pode fluir. 

Os espíritos utilizam o médium com gentileza e cuidado, sem esgotar suas reservas de energia psíquica. 

A Umbanda, certamente, bebeu das águas tradicionais da Kimbanda. 

Os negros bantus trouxeram sua herança espiritual, legítima, luminosa, ecológica e antiquíssima. 

Oramos para que as antigas almas dos Tatas e Yayas nos ajudem a separar o trigo do joio. 

Nzambi primeiro! Nsala Malekun! 

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