AS COLÔNIAS
ESPIRITUAIS E A CODIFICAÇÃO
Mar/2014
“Tudo deve estar em harmonia, no mundo espiritual, como no mundo
material; aos homens corpóreos, são necessários objetos materiais; aos
Espíritos, cujo corpo é fluídico, são necessários objetos fluídicos, os objetos
materiais não lhes serviriam, não mais do que os objetos fluídicos não serviriam
aos homens corpóreos”. (KARDEC).
Quando vemos companheiros,
de conhecimento muito maior que o nosso, dizerem que as colônias espirituais
mencionadas por André Luiz, via psicografia de Francisco Cândido Xavier
(1910-2002) não existem, ficamos a pensar se, pessoalmente, estamos “viajando na
maionese”.
Isso nos preocupa
sobremaneira visto ser nosso objetivo o de não fugir dos conceitos emanados das
obras da Codificação Espírita; mais ainda: quando vamos às tribunas, nas casas
espíritas, fazer estudos de temas evangélicos ou doutrinários, o que falamos
nessas oportunidades, para muitas pessoas, é visto como se fosse tudo ponto
doutrinário, já que nos veem como que falando em nome da Doutrina, como se
tivéssemos dela uma procuração, e não como interpretando seus
postulados.
Há uma orientação de Erasto
que não podemos nos esquecer dela; caso contrário, repudiaremos qualquer nova
ideia:
Na dúvida, abstém-te, diz um de vossos antigos provérbios; não
admitais, pois, senão o que vos é de uma evidência certa. Desde que uma opinião nova surge, por
pouco que ela vos pareça duvidosa, passai-a pelo crivo da razão e da lógica; o
que a razão e o bom senso reprovam, rejeitai-o ousadamente; mais vale repelir dez verdades, do que
admitir uma única mentira, uma única teoria falsa. Com efeito, sobre essa
teoria, poderíeis edificar todo um sistema que desabaria ao primeiro sopro da
verdade, como um monumento edificado sobre uma areia movediça; ao passo que, se
rejeitais hoje certas verdades, porque elas não vos são demonstradas lógica e
claramente, logo um fato brutal, ou uma demonstração irrefutável, virá vos
afirmar a sua autenticidade. (KARDEC, 1993f, p. 242, grifo
nosso).
Então, devemos ter mente
aberta para o novo; porém, devemos analisá-lo, passando-o pelo crivo da lógica e
da razão, para evitar que sejamos facilmente enganados por ideias estapafúrdias.
É, também, importante abdicar da ojeriza gratuita que, às vezes, temos por
coisas que julgamos fora da Codificação, pois pode estar lá e ainda não as
vimos.
A iniciativa de estudar o
tema surgiu quando estávamos lendo a obra Devassando o invisível, de
Yvonne do Amaral Pereira (1900-1984), em que a autora, no Capítulo I, “Nada
de novo...”, apresenta vários argumentos para defender a realidade das
colônias espirituais, contrapondo-se, ao que se deduz do teor do texto, aos que,
na sua época, não as aceitam como realidade; não é, portanto uma obra mediúnica;
reflete, apenas, a opinião pessoal da médium, calcada nas suas experiências
provinda do exercício de sua mediunidade, notadamente a de emancipação
consciente de sua alma.
O que achamos fantástico é a
menção que Yvonne faz de personalidades renomadas terem comungado com essa
ideia, entre elas e de um modo especial, cita nada menos que Léon Denis
(1846-1927), que sabemos ter sido o continuador de Kardec, após o seu
desencarne.
Alguns companheiros têm as
obras de Allan Kardec (1804-1869) como se nelas a doutrina estivesse completa e
acabada; porém, parece-nos, não ser bem assim:
Mas, dir-se-á, ao lado destes fatos [referindo-se às manifestações
espíritas] tendes uma teoria, uma doutrina; quem vos diz que essa teoria não sofrerá
variações; que a de hoje será a mesma em alguns anos?
Sem
dúvida, ele pode sofrer modificações em seus detalhes, em consequência de novas
observações. Mas estando o princípio doravante adquirido, não pode variar e
ainda menos ser anulado; aí está o essencial. Desde Copérnico e Galileu, calculou-se melhor o
movimento da Terra e dos astros, mas o fato do movimento permaneceu com o
princípio. (KARDEC, 2000c, p. 40, grifo nosso).
[…] As lacunas que a teoria atual pode ainda encerrar se encherão do
mesmo modo. O Espiritismo está longe
de ter dito a última palavra, quanto às suas consequências, mas é inabalável em
sua base, porque esta base se assenta sobre os fatos. (KARDEC, 2000c, p. 41,
grifo nosso).
O Livro
dos Espíritos não é um tratado completo do Espiritismo; não faz senão colocar-lhe as bases e os pontos
fundamentais, que devem se desenvolver sucessivamente pelo estudo e pela
observação. (KARDEC, 1993j, p. 223, grifo nosso).
Se bem que o Espiritismo não haja dito ainda a sua última palavra
sobre todos os pontos, ele se aproxima de seu complemento, e o momento não está
longe em que lhe será necessário dar uma base forte e durável, suscetível, no entanto, de receber todos
os desenvolvimentos que as circunstâncias ulteriores comportarem, e dando
toda segurança àqueles que se perguntam quem lhe tomará as rédeas depois de nós.
(KARDEC, 1993j, p. 370, grifo nosso).
O programa
da Doutrina não será, pois, invariável senão sobre os princípios passados ao
estado de verdades constatadas; para os
outros, ela não os admitirá, como sempre o fez, senão a título de hipóteses até a
confirmação. Se lhe for demonstrado que ela está no erro sobre um ponto, ela
se modificará sobre esse ponto. (KARDEC, 1993j, p. 377, grifo
nosso).
Além disso, convém notar que em parte alguma o ensino espírita foi
dado integralmente; ele diz respeito a tão grande número de observações, a
assuntos tão diferentes, exigindo conhecimentos e aptidões mediúnicas especiais,
que impossível era acharem-se reunidas num mesmo ponto todas as condições
necessárias. […].
A revelação faz-se assim parcialmente em diversos lugares e por uma
multidão de intermediários e é dessa
maneira que prossegue ainda, pois que nem tudo foi revelado. (KARDEC, 2007e,
p. 49, grifo nosso).
[…] Caminhando de par com
o progresso, o Espiritismo jamais será ultrapassado, porque, se novas
descobertas lhe demonstrarem estar em erro acerca de um ponto qualquer, ele se
modificará nesse ponto. Se uma verdade nova se revelar, ele a aceitará.
(KARDEC, 2007e, p. 54, grifo nosso).
Existem mais
considerações de Kardec, mas essas citadas já são suficientes para se perceber
que o Espiritismo não é uma Doutrina acabada e nem fechada; pode (e deve), sim,
incorporar novos pontos que não foram definidos no início da Codificação e, se
for o caso, modificar-se naquilo em que a Ciência provar que ele está
errado.
Antes de
apresentar alguns parágrafos da obra de Yvonne Pereira, iremos ver se na
Codificação podemos encontrar “espaço” para defender essa
ideia.
Tomaremos,
especificamente, da obra O Céu e
o Inferno para análise
de alguns de seus trechos:
[…] Além disso, em vez de perdidos nas profundezas do Espaço, estão
ao redor de nós; o mundo corporal e o mundo espiritual identificam-se em
perpétuas relações, assistindo-se mutuamente. (p. 28).
Existem, portanto, dois
mundos: o corporal, composto
de Espíritos encarnados; e o espiritual, formado dos Espíritos
desencarnados. Os seres do mundo corporal, devido mesmo à materialidade do seu
envoltório, estão ligados à Terra ou a qualquer globo; o mundo espiritual ostenta-se por toda
parte, em redor de nós como no Espaço, sem limite algum designado. Em razão
mesmo da natureza fluídica do seu envoltório, os seres que o compõem, em lugar
de se locomoverem penosamente sobre o solo, transpõem as distâncias com a
rapidez do pensamento. A morte do corpo não é mais que a ruptura dos laços que
os retinham cativos. (p. 32).
O mundo
espiritual tem esplendores por toda parte, harmonias e sensações que os Espíritos inferiores,
submetidos à influência da matéria, não entreveem sequer, e que somente são
acessíveis aos Espíritos purificados. (p.
33).
O Espírito
progride igualmente na erraticidade,
adquirindo conhecimentos especiais que não poderia obter na Terra, e modificando
as suas ideias. […]. (p. 36).
12. A
felicidade dos Espíritos bem-aventurados não consiste na ociosidade
contemplativa, que seria, como temos dito muitas vezes, uma eterna e fastidiosa
inutilidade.
A vida
espiritual em todos os seus graus é, ao contrário, uma constante atividade, mas
atividade isenta de fadigas. (p.
37).
15. Todas as inteligências concorrem, pois, para a obra
geral, qualquer que seja o grau atingido, e cada uma na medida das suas
forças, seja no estado de encarnação
ou no espiritual. Por toda parte a atividade, desde a base ao ápice da
escala, instruindo-se, coadjuvando-se em mútuo apoio, dando-se as mãos para
alcançarem o zênite. (p. 38).
25º – Espíritos há
mergulhados em densa treva; outros se encontram em absoluto insulamento no
Espaço, atormentados pela ignorância da própria posição, como da sorte que os
aguarda. Os mais culpados padecem torturas muito mais pungentes por não lhes
entreverem um termo.
Alguns são privados de ver os seres queridos, e todos, geralmente,
passam com intensidade relativa pelos males, pelas dores e privações que a
outrem ocasionaram. Esta situação
perdura até que o desejo de reparação pelo arrependimento lhes traga a calma
para entrever a possibilidade de, por eles mesmos, pôr um termo à sua
situação.
26º – Para o orgulhoso relegado às classes inferiores, é suplício ver acima dele colocados,
cheios de glória e bem-estar, os que na Terra desprezara. O hipócrita vê
desvendados, penetrados e lidos por todo o mundo os seus mais secretos
pensamentos, sem que os possa ocultar ou dissimular; o sátiro, na impotência de
os saciar, tem na exaltação dos bestiais desejos o mais atroz tormento; vê o
avaro o esbanjamento inevitável do seu tesouro, enquanto que o egoísta,
desamparado de todos, sofre as consequências da sua atitude terrena; nem a sede
nem a fome lhe serão mitigadas, nem amigas mãos se lhe estenderão às suas mãos
súplices; e pois que em vida só de si cuidara, ninguém dele se compadecerá na
morte. (p. 105-106).
(KARDEC, 2007d, passim, grifo
nosso).
Acreditamos
que tudo o que acima é falado pode, sim, servir de base para que a vida no mundo
espiritual não seja apenas uma bela tela com “anjos tocando harpa”; é ativa e
com reais possibilidade de aprendermos muitas coisas, quando nele estamos, no
intervalo das reencarnações: “Por
toda a parte, no mundo espiritual, a atividade, em nenhum ponto a ociosidade
inútil”. (KARDEC, 2007e, p. 251).
Yvonne
A. Pereira, tece várias considerações, quanto à possibilidade de existirem
colônias no mundo espiritual; dentre elas destacamos:
Desde o
advento da Doutrina Espírita, os nobres habitantes do mundo espiritual que se
têm comunicado com os homens, através de grande variedade de médiuns, afirmam
ser a Terra um pálido reflexo do Espaço. ”O Livro dos Médiuns", de
Allan Kardec, no belo capítulo VIII – “Do Laboratório do Mundo
Invisível” – é fecundo em
explicações que oferecem base para estudos e conclusões muito profundas quanto à
vertiginosa intensidade do plano invisível, a possibilidade de realizações, ali,
por assim dizer, “materiais”, que as entidades desencarnadas sempre afirmaram e
que nos últimos tempos vêm confirmando com insistência e pormenores dignos de
atenção. E no precioso compêndio “A Gênese”, também
de Allan Kardec, lemos o seguinte, no capítulo XIV, sob o título – Ação dos Espíritos sobre os fluidos –
Criações fluídicas – Fotografias do pensamento:
“Os fluidos espirituais, que
constituem um dos estados do fluido cósmico universal, são, a bem dizer, a
atmosfera dos seres espirituais; o elemento donde eles tiram os materiais sobre
que operam; o meio onde ocorrem os fenômenos especiais, perceptíveis à visão e à
audição do Espírito, mas que escapam aos sentidos carnais, impressionáveis
somente à matéria tangível; o meio onde se forma a luz peculiar ao mundo
espiritual, diferente, pela causa e pelos efeitos, da luz ordinária; finalmente,
o veículo do pensamento, como o ar o é do som.
“Os Espíritos atuam sobre os
fluidos espirituais, não manipulando-os como os homens manipulam os gases, mas
empregando o pensamento e a vontade. (O grifo é nosso.) Para os Espíritos, o
pensamento e a vontade são o que é a mão para o homem. Pelo pensamento, eles
imprimem àqueles fluidos tal ou qual direção, os aglomeram, combinam ou
dispersam, organizam com eles conjuntos que apresentam uma aparência, uma forma,
uma coloração determinadas; mudam-lhes as propriedades, como um químico muda a
dos gases ou de outros corpos combinando-os segundo certas leis. É a grande
oficina ou laboratório da
vida espiritual”.
(Parágrafos 13 e 14.)
E, no parágrafo 3, desse
mesmo capítulo, encontraremos:
“No estado de eterização, o
fluido cósmico não é uniforme: sem deixar de ser etéreo, sofre modificações tão
variadas em gênero e mais numerosas talvez do que no estado de matéria tangível.
Essas modificações constituem fluidos distintos que, embora procedentes do mesmo
princípio, são dotados de propriedades especiais e dão lugar aos fenômenos
peculiares ao mundo invisível. Dentro da relatividade de tudo, esses fluidos têm
para os Espíritos, que também são fluídicos, uma aparência tão material, quanto
a dos objetos tangíveis para os encarnados, e são, para eles, o que são para nós
as substâncias do mundo terrestre. Eles os elaboram e combinam para produzirem
determinados efeitos, como fazem os homens com os seus materiais, ainda que por
processos diferentes”.
Os próprios Espíritos ditos
sofredores, até mesmo os criminosos, que se costumam apresentar em bem dirigidas
sessões práticas, narram acontecimentos reais, positivos, que no Invisível se
sucedem, um modo de viver e de agir, no Espaço, muito distanciado daquele estado
vago, indefinível, inexpressivo, que muitos entendem seja o único verdadeiro,
quando a Revelação propala, desde o início, um mundo de vida intensa, mundo real e de
realidades, onde o trabalho se desdobra ao infinito e as realizações não
conhecem ocasos. Nas entrelinhas de grandes e conceituadas obras doutrinárias,
existem claras alusões a sociedades, ou “colônias”, organizadas no Além-Túmulo,
onde avultamcidades, casas, palácios, jardins, etc., etc. […]. (PEREIRA,
1987, p. 10-12, grifo do original).
Esses argumentos são
pertinentes e, s.m.j, condizem com o que se poderia esperar de um estudioso em
defesa de seu ponto de vista, ou seja, basear-se nas obras da Codificação. A
surpresa maior veio na sequência, quando Yvonne cita Léon Denis:
Na erudita e
encantadora obra “Depois da
Morte”, do eminente colaborador de Allan Kardec, Léon Denis, o qual,
como sabemos, além de primoroso escritor foi um grande inspirado pelos Espíritos
de escol, à página 235 da 7ª edição (FEB), Cap. XXXV, a exposição dessa tese não
somente é fecunda e expressiva, como também mesclada de grande beleza, como tudo
o que passou por aquele cérebro e aquela pena. Diz Léon Denis, na citada
obra:
“O Espírito, pelo poder da
sua vontade, opera sobre os fluidos do Espaço, combina-os e os dispõe a seu
gosto, dá-lhes as cores e as formas que convêm ao seu fim. É por meio desses
fluidos que se executam obras que desafiam toda comparação e toda análise. Construções aéreas, de cores brilhantes,
de zimbórios resplandecentes: circos imensos onde se reúnem em conselho os
delegados do Universo; templos de vastas proporções, donde se elevam acordes de
uma harmonia divina; quadros variados, luminosos: reproduções de vidas humanas,
vidas de fé e de sacrifício, apostolados dolorosos, dramas do Infinito (1). Como descrever magnificências que
os próprios Espíritos se declaram impotentes para exprimir no vocabulário
humano? É nessas moradas fluídicas
que se ostentam as pompas das festas espirituais. Os Espíritos puros,
ofuscantes de luz, se agrupam em famílias. Seu brilho e as cores variadas de
seus invólucros permitem medir a sua elevação, determinar os seus atributos”.
(Os grifos são nossos.).
E ainda outros trechos desse
belo volume trazem informações a respeito do assunto, bastando que o leiamos com
a devida atenção, bem assim vários capítulos de outra obra sua – “O Problema do
Ser, do Destino e da Dor”. Em outro magnífico livro do grande Denis – “No Invisível” –, à página 470, no cap. XXVI, da 3ª edição
(FEB), há também este pequeno trecho, profundo complexo, sugestivo,
descortinando afirmações grandiosas:
“Dante Alighieri é médium
incomparável. Sua “Divina
Comédia” é uma
peregrinação através dos mundos
invisíveis. Ozanã, o principal autor católico que já analisou essa obra
genial, reconhece que o seu plano é
calcado nas grandes linhas da iniciação nos mistérios antigos, cujo princípio,
como é sabido, era a comunhão com o oculto”. (Os grifos são nossos.)
Assim se expressa o grande
inspirado Léon Denis, em suas obras, e, se mais não transcrevemos aqui, será por
economia de espaço, que precisaremos atender. Do exposto, no entanto,
deduziremos que a “Divina
Comédia” não apresenta tão
somente fantasias, como imaginaram os próprios eruditos, mas ocorrências reais
do Além-Túmulo, que o poeta visionário mesclou de divagações, talvez
propositadamente, numa época de incompreensões e preconceitos ainda mais
intransigentes que os verificados em nossos dias (2).
______
(1)
São essas reproduções de vidas humanas que os Instrutores Espirituais dão a ver
aos médiuns, no Espaço, durante o sono letárgico, ou desdobramento, e dos quais
se originam os romances mediúnicos, sempre tão atraentes. Vide capítulo
VI.
(2)
Dante Alighieri – Ilustre poeta e pensador italiano, nascido em 1265 e falecido
em 1321, autor do poema épico “Divina Comédia”, considerado “uma das mais altas
concepções do espírito humano”. Esse poema contém as ideias e a filosofia da
Idade Média e se divide em três pontos: o Inferno, o Purgatório e o Paraíso, e
figura uma viagem do poeta ao Mundo Invisível. Pode-se acrescentar que essa obra
imortal criou a poesia e a linguagem italianas.
(PEREIRA, 1987, p. 12-14,
grifo do original).
Apresentar Léon Denis como
defensor da causa foi algo como que um certeiro “tiro na mosca”, porquanto não
há o que se falar de serem antidoutrinárias as colocações dele, e muito menos,
que tenha “viajado na maionese”, como se diz popularmente.
Mas Yvonne, ao
apresentar argumentos filosóficos, baseada em Denis, não para por aí; com outro
personagem busca a vertente científica, ao trazer as considerações do sábio
italiano Ernesto Bozzano (1862-1943):
Os preciosos volumes
escritos pelo sábio psiquista italiano Ernesto Bozzano, produto de severa
análise científica, são férteis em apontar esses mesmos locais do Invisível,
revelados por Espíritos desencarnados de adiantamento moralespiritual normal,
cujas comunicações, psicografadas por vários médiuns desconhecidos uns dos
outros, alguns até completamente alheios ao Espiritismo, foram examinadas e
cientificamente analisadas por aquele ilustre autor. Ser-nosá impossível
transcrever, aqui, muitos trechos de Bozzano a respeito, visto que em suas obras
encontramos fartas observações em torno da tese em apreço. Limitar-nos-emos a
citar alguns trechos do interessante livro “A Crise da Morte”, onde
substancioso noticiário encontraremos sobre o assunto, além de alguns “detalhes
fundamentais” da sua análise sobre comunicações com Espíritos desencarnados.
Assim é que, no “Décimo-quarto caso”, analisando uma das comunicações inseridas
no mesmo volume, Bozzano observa que – a paisagem “astral” se compõe de duas
séries de objetivações do pensamento, bem distinta uma da outra. A primeira é permanente e imutável, por
ser a objetivação do pensamento e da vontade de entidades espirituais muito
elevadas, prepostas ao governo das esferas espirituais inferiores; a outra
é, ao contrário, transitória e muito mutável; seria a objetivação do pensamento
e da vontade de cada entidade desencarnada, criadora do seu próprio meio
imediato”.
(3) (Os grifos são
nossos.)
À página 153 da referida
obra, nas “Conclusões” relativas ao último caso, leremos o seguinte, no “detalhe
fundamental” nº 6:
“Terem-se achado (os
Espíritos recém-desencarnados) num meio espiritual radioso e maravilhoso (no
caso de mortos moralmente normais), e num meio tenebroso e opressivo (no caso de
mortos moralmente depravados)”.
No “detalhe” nº
7:
“Terem reconhecido que o meio espiritual era um novo mundo
objetivo, substancial, real, análogo ao meio terrestre
espiritualizado”.
No “detalhe” nº
8:
“Haverem aprendido que isso
era devido ao fato de que, no mundo
espiritual, o pensamento constitui uma força criadora, por meio da qual todo
Espírito existente no mundo ‘astral’ pode reproduzir em torno de si o meio de
suas recordações”.
No “detalhe” nº
12:
“Terem aprendido que os Espíritos dos mortos gravitam
fatalmente e automaticamente para a esfera espiritual que lhes convém, por
virtude da lei de afinidades”. (Os grifos são nossos.)
E ponderamos nós: Se os Espíritos dos mortos fatalmente e
automaticamente gravitam para a esfera espiritual que lhes convém, é que
tais esferas existiam mesmo antes de eles para lá gravitarem, criadas,
certamente, por outros Espíritos, com os quais passarão a colaborar, na medida
das próprias forças. Com efeito. No “detalhe secundário” nº 4, do mesmo
caso,
Bozzano analisa:
“Acham-se de acordo (as
almas dos mortos) em afirmar que, embora os Espíritos tenham a faculdade de
criar mais ou menos bem, pela força do pensamento, o que lhes seja necessário,
todavia, quando se trata de obras complexas e importantes, a tarefa é confiada a
grupos de Espíritos que nisso se especializaram”.
Dentre as comunicações
analisadas por Bozzano, ressaltaremos as concedidas pelo Espírito do
inesquecível artista cinematográfico Rodolfo Valentino, falecido em Agosto de
1926, à sua esposa Natacha Rambowa, nas sessões realizadas em Nice, na França, e
consideradas cientificamente muito importantes, nas quais são citados pormenores
desse mundo espiritual, e que muito edificam os estudiosos. Não nos furtaremos
ao prazer de oferecer ao leitor um substancioso trecho das mesmas comunicações.
Assim se expressa o Espírito do célebre “astro”, através da psicografia do
médium norte-americano, Jorge Benjamim Wehner, dirigindo-se à sua
esposa:
– “Aqui, tudo o que existe
parece constituído em virtude das diferentes modalidades pelas quais se
manifesta a força do pensamento. Afirmam-me que a substância sobre que se exerce
a força do pensamento é, na realidade, mais sólida e mais durável do que as
pedras e os metais no meio terrestre.
Muitas dificuldades
encontrais, naturalmente, para conceber semelhante coisa, que, parece, não se
concilia com a ideia que se pode formar das modalidades em que devera
manifestar-se a força do pensamento. Eu, por minha parte, imaginava tratar-se de
criações formadas de uma matéria vaporosa; elas, porém, são, ao contrário, mais sólidas e
revestidas de cores mais vivas, do que o são os objetos sólidos e coloridos do
meio terrestre... As habitações são construídas por Espíritos que se
especializaram em modelar, pela força do pensamento, essa matéria
espiritual. Eles as constroem sempre tais como as desejam os Espíritos, pois
que tomam às subconsciências destes últimos os gabaritos mentais de seus
desejos”. (Os grifos são nossos.)
______
(3) Certa vez, durante um
transporte em corpo astral, tivemos ocasião de visitar, no Espaço, conduzida
pelo Espírito de nossa mãe, uma tia falecida havia três anos, Sra. Ernestina
Ferraz, de quem fôramos muito amiga e de quem recebêramos, sempre, muitas provas
de dedicação e ternura maternal, sobre a Terra. Recebeu-nos em “um meio
imediato”, segundo as expressões de Bozzano, criado por ela própria, pois havia
um salão de visitas idêntico ao de sua antiga residência terrena, com o velho
piano de carvalho que fora seu (ou a sua reprodução fluídica), e que,
presentemente, se encontra em nosso poder. Aberto, com a partitura no local
devido, o piano fluídico era dedilhado por sua irmã caçula, Luísa, também já
falecida, a qual ela própria educara, inclusive ensinando-lhe música. Tal a
realidade da criação que, talvez perturbada com a situação frisante, exclamamos,
algo vexada:
– Oh, titia! O seu piano
está necessitado de um reparo... está desafinado... mas prometo que o mandarei
consertar...
E ela,
prontamente:
– Não te incomodes, minha
filha, com este meu piano... Presentemente, o piano, devidamente conservado, é
mantido como recordação da boa amiga que tanto nos serviu.
(PEREIRA, 1987, p. 14-17,
grifo do original).
Bom, o apoio de Bozzano é
importante, porquanto foi um dos cientistas que, lá nos primórdios da
Codificação, estudou as manifestações dos espíritos.
Pensa que a Yvonne
parou?! Nada, pois ainda apresenta um novo personagem; trata-se do rev. George
Vale Owen (1869-1931), religioso e médium inglês:
Um livro ainda mais antigo
do que as obras de Bozzano - “A
Vida Além do Véu” – obtido
também mediunicamente pelo pastor protestante Rev. G. Vale Owen, tornou-se
célebre no assunto, pois que o Espírito da genitora do próprio médium narra ao
filho, em comunicações periódicas, as mesmas construções fluídicas do mundo
espiritual, isto é, jardins, estradas pitorescas, habitações, cidades, etc.
semelhante médium é, certamente, insuspeito, visto que, como protestante, seriam
bem outras as ideias que alimentaria quanto à vida espiritual. Tais
comunicações, em sua maioria, datam do ano de 1913. Convém deliciarmos, ainda,
as nossas almas com alguns pequenos trechos de tão interessante
livro:
– “Pode agora fazer-me o
favor de descrever sua casa, paisagens, etc.?” – Pergunta o Rev. Vale Owen ao
Espírito de sua mãe.
E este responde:
– “É a Terra aperfeiçoada.
Certo, o que chamais quarta dimensão, até certo ponto existe aqui, mas não
podemos descrevê-la claramente. Nós temos montes, rios, belas florestas, e
muitas casas; tudo foi preparado pelos que nos
precederam. Trabalhamos,
atualmente, por nossa vez, construindo e regulando tudo para os que, ainda
durante algum tempo, têm que continuar a sua luta na Terra. Quando eles vierem,
encontrarão tudo pronto e preparado para recebê-los”.
– “O tecido e a cor do
nosso vestuário tomam a sua
qualidade do estado espiritual e do caráter de quem o usa. (O grifo é nosso.) O
nosso ambiente é parte de nós mesmos e a luz é um importante componente do nosso
ambiente. Entretanto, é de poderosa aplicação, debaixo de certas condições, como
poderemos ver naqueles salões”.
– “Não teriam de ser
demolidas (as edificações), para aproveitar-se depois o material em nova
construção. Seria ele aproveitado com o prédio em pé. O tempo não tem ação de
espécie alguma sobre as nossas edificações. Elas não se desfazem nem se
arruínam. Sua durabilidade depende apenas da vontade dos donos, e, enquanto eles
quiserem, o edifício ficará de pé, podendo ser alterado ou modificado consoante
seus desejos.
– “...porque estas
esferas são espirituais e não materiais“. (Grifo nosso.)
E o livro todo assim
prossegue, em revelações belas e simples, lógicas e edificantes, o que confirma
o noticiário de muitos médiuns, que também chegam a verificar tais realidades do
mundo invisível durante seus desdobramentos em espírito.
(PEREIRA, 1987, p. 17-18,
grifo do original).
Portanto, com esses três
autores citados a médium Yvonne A. Pereira conseguiu nos convencer da realidade
das colônias espirituais ou construções diversas no mundo espiritual. Sim, ela
com as provas apresentadas, venceu o nosso achismo.
A nosso ver, o que ela
apresenta vem, judiciosamente, corroborar muitas coisas relacionadas ao tema
citadas nas obras inspiradas pelo Espírito André Luiz, que, ultimamente, têm
sido questionadas por vários companheiros, que, talvez, não tenham atentado pelo
que Léon Denis, Ernesto Bozzano e George Vale Owen apresentam em suas
respectivas obras, conforme exposto nos apontamentos de Yvonne.
Na Revista Espírita 1865, encontramos uma comunicação
assinada pelo espírito Mesmer, da qual transcrevemos este pequeno
trecho:
O mundo dos
invisíveis é como o vosso; em lugar de ser material e grosseiro, é fluídico,
etéreo, da natureza do perispírito, que é o verdadeiro corpo do Espírito,
haurido nesses meios moleculares, como o vosso se forma de coisas mais
palpáveis, tangíveis, materiais.
O mundo dos
Espíritos não é o reflexo do vosso; é o vosso que é uma grosseira e muito
imperfeita imagem do reino de além-túmulo. (KARDEC, 2000c, p. 160, grifo
nosso).
Trazemos algo que Kardec
disse que, julgamos, confirma tudo isso: “Consideramos, pois, o mundo dos
Espíritos como o duplo do mundo corpóreo, como uma fração da Humanidade […].”
(KARDEC, 1993i, p. 110, 1993i).
Há na Revista Espírita 1859, um artigo sob
o título de “Música de
além-túmulo”, onde costa que na reunião da Sociedade Espírita de Paris,
realizada a 08 de abril, os espíritos dos compositores Mozart e Chopin foram
evocados. Da parte em que relata o diálogo com Chopin,
transcrevemos:
20. Estais
bem errante?
– R. Sim; quer dizer que não pertenço a nenhum planeta
exclusivamente.
21. E vossos
executantes, estão também errantes?
– Errantes como eu.
22. (A
Mozart) Teríeis a bondade de nos explicar o que Chopin acaba de
dizer?
– R.
Concebo vosso espanto; todavia, dissemo-vos que há mundos particularmente
atribuídos aos seres errantes, mundos nos quais podem habitar temporariamente;
espécies de acampamentos, de campos para repousar seus espíritos fatigados por uma longa
erraticidade, estado sempre um pouco penoso. (KARDEC, 1993e, p. 125, grifo
nosso).
Tendo em
vista essa referência a mundos intermediários ou transitórios nos quais habitam
espíritos errantes, ou seja, os que se encontram na dimensão espiritual
aguardando nova encarnação, Kardec resolve, numa outra oportunidade, questionar
ao espírito Santo Agostinho sobre eles, de cujas considerações podemos resumir
(KARDEC, 1993e, p. 126):
– ocupam
posições intermediárias entre os outros mundos;
– neles os
Espíritos têm o objetivo de se instruírem;
– têm posição
transitória e são destinados a espíritos Errantes;
– não são
habitados por seres corpóreos;
– têm
superfície é estéril, condição temporária;
– a Terra foi
um desses mundos durante a sua formação.
Após
essa comunicação Kardec faz a seguinte consideração: “Essa comunicação confirma, uma vez mais,
essa grande verdade que nada é inútil na Natureza; casa coisa tem seu objetivo,
sua destinação; nada está no vazio,
tudo está habitado, a vida está por toda parte”. (KARDEC, 1993e, p.
126-127, grifo nosso).
Ora, se por
aqui temos que há Espíritos errantes que vivem em planetas em formação, por que
também não poderia criar colônias espirituais localizadas nas cercanias de algum
planeta ao qual têm interesses?
Podemos
acrescentar que essa informação sobre a existência das colônias espirituais é
encontrada em outros autores espirituais, como por exemplo, João Lúcio na
psicografia da obra Em Novos
Horizontes, por Wagner Gomes da Paixão (1962- ) e de Joanna de Ângelis
em No limiar do infinito,
via Divaldo P. Franco (1927- ). Nesta última obra, temos o capítulo 12
intitulado “A vida espírita ou
espiritual”, do qual transcrevemos o seguinte trecho:
Sendo a vida na Terra, suas edificações e
paisagens um símile mais condensado e algo mais grosseiro do que existe no mundo
espírita ou espiritual, facilmente se compreenderá que o progresso na região
das causas transcende em beleza as realizações, superando em emoções e efeitos
tudo quanto a imaginação pode conceber.
Desde os
sítios mais grotescos e sombrios, onde se fixam os núcleos de depuração
compulsória para os que dilapidam, irresponsáveis, os preciosos dons da
existência, até aos altos círculos de felicidade nas vibrações circunvizinhas da Terra, há
uma infinita variedade de vilas e cidades, círculos espirituais e postos de
socorro onde vivem os que se vinculam ao planeta generoso, que nos serve de
berço e escola de progresso nos intervalos de uma para outra reencarnação. Plasmados pelas mentes que as moldam no
fluido universal, são populosos centros de vida em que o amor estua,
verdadeiros céus […].
Não
se tratam de lugares hipotéticos, ou de
centros onde campeia a ociosidade em aposentadoria demorada, ou de paisagens
fantasistas para o repouso da inutilidade.
Há atividades
febricitantes em que o culto ao trabalho fomenta o progresso das mentes e
aprimora os sentimentos.
De
forma alguma são mundos quiméricos, imateriais, sobrenaturais, mas searas de ação objetiva, organizações promovidas
pelo espírito humano, distantes ainda dos mundos da divina
benção.
[…].
Perfeitamente lógica a ocorrência da multiplicidade das Cidades e
Colônias Espirituais no mundo das causas.
[…].
Metrópoles trabalhadas em substância sutil, plástica e de
fácil moldagem às mentes ditosas,
constituem os painéis de incomparável dita onde reinam a paz, a ventura plena e
a felicidade sem jaça.
Há
incontáveis instituições beneficentes e socorristas no
além-túmulo, que se afervoram no auxílio
aos que transitam na Terra e partem do corpo após a desencarnação,
[…].
Legiões de
abnegados e caridosos mensageiros do
Senhor recolhem em Institutos de recuperação e aperfeiçoamento os desencarnados em dor,
[…].
Educandários e hospitais de retificação, à semelhança dos
que existem na Terra, melhor organizados e mais aprimorados, se abrem convidativos, como santuários de recolhimento
e correção para a elevação dos caídos […].
Conforme
existem na Terra conglomerados e
organizações humanas para albergar a imensa legião de criaturas, no plano
espiritual sucedem-se, múltiplos, acolhedores como ninhos de ventura
[…].
Ninguém se
surpreenda, portanto, que a vida espiritual seja refletida nas comunidades terrenas, que são cópias
imperfeitas das sociedades vigentes nos círculos superiores do Orbe e nos
planetas onde a vida estua sem
sombra, sem dor, sem morte, sem adeus... (FRANCO, 2000, p. 97-102, grifo
nosso).
O exposto
aqui corrobora em tudo o que se pode encontrar nas narrativas de André Luiz.
Para que não mais existam dúvidas recomendamos a obra Colônias Espirituais, na
qual a autora Lúcia Maria Farias Loureiro de Souza (1944- ) ou, simplesmente,
Lúcia Loureiro, apresenta uma profunda pesquisa sobre esse
assunto.
Paulo da Silva Neto
Sobrinho
Mar/2014.
Referências
bibliográficas
KARDEC, A. A Gênese. Rio de Janeiro: FEB,
2007e.
KARDEC, A. O Céu e o Inferno. Rio de
Janeiro: FEB, 2007d.
KARDEC, A. O Evangelho Segundo o
Espiritismo. Rio de Janeiro: FEB, 1996.
KARDEC, A. O Livro dos Médiuns. Rio de
Janeiro: FEB, 2007b.
KARDEC, A. Revista Espírita 1861. Araras, SP: IDE,
1993f.
KARDEC, A. Revista Espírita 1865. Araras, SP: IDE,
2000c.
KARDEC, A. Revista Espírita 1866. Araras, SP: IDE,
1993i.
KARDEC, A. Revista Espírita 1868. Araras, SP: IDE,
1993j.
LOUREIRO, L. Colônias Espirituais. São
Paulo: Editora Mnêmio Túlio, 1995.
PAIXÃO, W. G. Em Novos Horizontes. Belo
Horizonte, UEM, 2004.
PEREIRA, Y. A. Devassando o invisível. Rio de
Janeiro: FEB, 1987.
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