Ocorrências
No entorno do Distrito Federal, dois terreiros já foram atacados nos últimos dias. O episódio mais grave foi em Santo Antônio do Descoberto (GO), onde o templo ficou destruído depois de incêndio criminoso. Em Águas Lindas (GO), homens usaram uma caminhonete para derrubar o portão na entrada do espaço. Na terça-feira (15), os agressores voltaram e atearam fogo. Até agora, ninguém foi preso.
Babazinho de Oxalá, do terreiro em Santo Antonio do Descoberto, contou que um mês antes os criminosos já haviam invadido o espaço, quando quebraram tudo.
Foi ainda lembrado, entre outros casos, o da menina Kayllane Campos, 11 anos, vítima de agressão no Rio de Janeiro, em junho. Vestida com a indumentária de culto, ele voltava para casa depois de participar de um culto de candomblé quando foi atingida com uma pedrada na cabeça. Depois disso, líderes religiosos realizaram na capital fluminense um ato contra a intolerância religiosa e em apoio à menina.
Adna Santos de Araújo, também conhecida como Mãe Baiana, coordenadora de Comunidades de Matriz Africana de Terreiros da Fundação Cultural Palmares, informou que o órgão já recebeu registros de 218 denúncias de atos de violência contra espaços de culto de religiões de matriz africana.
Segundo ela, a procuradoria da secretaria está acompanhando todas as ocorrências, buscando garantir que sejam apuradas e os responsáveis punidos. A seu ver, os atos não são apenas de violência, mas também denotam racismo e devem ser enquadrados legalmente desse modo, como crime inafiançável.
Cantos e tambores
A audiência foi marcada pelos sons de tambores e cânticos dedicados aos orixás nas cerimônias nos terreiros. Antes de sua manifestação, a Mãe Railda Rocha Pitta, de Brasília, acompanhada pela plateia formada de “povo de santo”, entoou a saudação a Xangô, que tem nas quartas-feiras o seu dia. Contou sua história e propôs reflexões sobre a tolerância, sempre citando simbologias relacionadas às divindades do candomblé.
— É preciso mudar este cenário de ódio para uma realidade de amor. Aprendam com Oxum, a deusa das águas doces e a maior expressão de amor: é preciso que a vida seja doce como mel e vivificante como a água, que é essencial para a nossa existência — afirmou.
O senador Paulo Paim (PT-RS), que preside a CDH, antes de passar o comando dos trabalhos a Cristovam, observou que o natural seria cada brasileiro estar tranquilo e em paz para praticar a religião escolhida, qualquer que seja. No entanto, diante dos casos de intolerância, disse que não adianta apenas “chorar sobre o sangue derramado”, mas estimular o debate e fortalecer o respeito à diversidade.
— A liberdade de culto e religião é cláusula pétrea da nossa Constituição. É necessário defender o direito de todos a manter sua identidade e as suas raízes — reforçou.
Na visão do Babá Adailton Moreira Costa, do Rio de Janeiro, hoje é necessário falar não apenas em “tolerância”, a seu ver uma palavra que está “em cima do muro”. Antes de tudo, disse ele, deve haver respeito à tradição religiosa de cada um. Para o líder religioso, a violência de cunho religioso ocupa o mesmo contexto do racismo, da homofobia e da violência sexual e de gênero.
Com emoção, outro babalorixá presente à audiência, Pecê de Oxumaré, de quem partiu a sugestão da audiência ao senador Cristovam, cobrou respeito ao “povo de santo”, lembrando os que fogem disso negam a Bíblia que dizem seguir.
— Nós temos respeito e amor: respeitamos a natureza, o outro e abrimos nossas portas sem perguntar quem está chegando e sem pedir antecedentes criminais. Para qualquer um que chegar, a porta estará sempre aberta — disse.
Ecumenismo
O frei David Santos, da Educafro, entidade que luta contra o racismo e desigualdade social, informou que estava ali como representante de uma entidade que cultua o ecumenismo. Celebrou a presença do Papa Francisco à frente da Igreja, salientando que o líder católico levou adiante o compromisso com o diálogo interreligioso. Depois, o frei criticou a postura de segmentos evangélicos que estimulam o preconceito contra religiões de matriz africana. A postura desses grupos não representam verdadeiramente os evangélicos.
— Essa postura não representa as expressões evangélicas; essas são pessoas desequilibradas que representam pequenos grupos — afirmou.
Pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH-PR), Alexandre Brasil Carvalho detalhou as ações e mecanismos do Plano Nacional de Direitos Humanos contra a intolerância Religiosa. Citou o aperfeiçoamento do sistema de ouvidoria e a produção de relatórios sobre casos de intolerância e preconceito. Outra ação é estimular fóruns permanentes de dialógo interreligoso nos estados e municípios, hoje já existindo sete organizações do tipo em todo o país.
Reivindicações
Além da proposta para a instalação da CPI, os participantes da audiência apresentaram outros pedidos à comissão, como um apelo para envio de carta ao governador de Goiás, Marconi Perillo. A intenção é pedir providências para que sejam investigados os ataques a terreiros nas cidades goianas no entorno do DF.
Foi também solicitada negociação com o governador do DF, Rodrigo Rollemberg, para que estenda aos terreiros as garantias de concessão de áreas, como já é feito em favor de outras religiões, para que edifiquem seus templos. O advogado Bernardo Sukennik sugeriu também que seja solicitado à Ordem dos Advogados do Brasil, no nível nacional e DF, a criação da Comissão de Liberdade Religiosa.
Os senadores Regina Souza (PT-PI), Omar Aziz (PSD-AM), Hélio José (PSD-DF), Otto Alencar (PSD-BA) e Donizeti Nogueira (PT-TO) manifestaram solidariedade e se colocaram à disposição para apoiar ações contra a intolerância religiosa. Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)
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